MANDATO REALIZA AUDIÊNCIA PÚBLICA SOBRE MALDADES DA MP 759/16

Notícias 06/04/2017
A regularização fundiária e a reforma urbana sofrem, neste momento, um vil ataque. No final de 2016, o governo ilegítimo de Michel Temer editou a Medida Provisória MP 759/16, maquiada com o objetivo de facilitar a regularização fundiária de terras urbanas e rurais. Mas, apesar da repetição do discurso oficial pela mídia hegemônica, as análises da MP mostram que, por trás dessa proposta, há uma tentativa de mercantilização das terras ocupadas por assentamentos da reforma agrária e dos assentamentos informais urbanos, anistia às ocupações irregulares de alto padrão, além da venda, sem qualquer critério de interesse social ou coletivo, de imóveis que são patrimônio da União.
A Câmara Municipal de Florianópolis, a pedido do vereador Lino Peres - demandado pelo Insituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU) -, realizou Audiência Pública sobre o assunto no dia 27 de março no Plenarinho Deputado Paulo Stuart Wright, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Henrique Frota, advogado e secretário executivo do IBDU, e Rosane Tierno, advogada especialista em Regularização Fundiária que trabalhou no Ministério das Cidades no governo Lula, foram os palestrantes, e a mesa contou com a presença de representantes do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Santa Catarina (CAU/SC), Instituto de Arquitetos do Brasil - Santa Catarina (IAB-SC), Ministério Público Estadual (MPE-SC), Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE-SC) e Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Planejamento e Desenvolvimento Urbano (SMDU).
Publicada sem qualquer diálogo com a sociedade civil e órgãos públicos atuantes no tema, revoga todas as leis que tratavam dos processos de regularização fundiária no país, como a Lei 6.015/1973, do registro fundiário; a Lei 11.977/2009, do Minha Casa, Minha Vida, com normas para a regularização fundiária de assentamentos em áreas urbanas de interesse social, e a Lei 10.257/2001, o Estatuto da Cidade, que determina ser de responsabilidade do município a política de desenvolvimento urbano. Centenas de especialistas, movimentos sociais e entidades já se pronunciaram publicamente contra afirmando que por trás do discurso oficial há uma tentativa de privatização de terras através da titulação individual. Entre outras coisas, a MP encerraria a possibilidade de da reforma agrária no país e favoreceria o processo de grilagem na Amazônia.
MERCANTILIZAÇÃO DA TERRA
“Quando você trata de propriedade privada em uma lei imbricada, difícil e tecnicista como essa, você não consegue entender as maldades que estão no meio e como que ela pode comprometer os direitos”, avaliou Rosane Tierno durante a audiência pública.
Ela apontou que a MP trata os imóveis como simples mercadoria. “A propriedade tem um valor econômico sim, mas acima de tudo ela tem um valor como direito subjetivo, especialmente para a população de baixa renda”. O objetivo do Governo Temer é gerar crédito imobiliário e criar mercadorias e não garantir direitos.
A ex-gerente de projetos do Ministério das Cidades indicou ainda que a regularização fundiária, como está pensada, atende a ao pensamento neoliberal que vê a regularização fundiária como um mecanismo de criar uma mercadoria titulada passível de ser oferecida em garantia de crédito. É oposto a outro pensamento acadêmico que defende “o lote urbanizado como um direito a moradia, um direito subjetivo previsto na constituição, que não pode ser negado pelo poder público”. Rosane ainda alertou que a mudança brusca na legislação levará a uma paralisação de processos fundiários por vários anos até que a nova lei seja acomodada.
No mesmo sentido, o advogado Henrique Botelho Frota, secretário executivo do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU), reforçou essa interpretação. “Num primeiro momento há um discurso de que haverá titularização e isso atende a população de baixa renda, num segundo momento dessa titularização em massa não se garante a permanência dessas pessoas de maneira organizada e com qualidade de vida”.
Uma das provas de que não há interesse social nas regularizações é que a MP 759/2016 revogou o conceito expresso na Lei 11.977/2009: “A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”.
Para Frota, “trabalhar a titularização sem trabalhar outros aspectos torna essas populações mais vulneráveis às pressões do mercado imobiliário”. Embora, não fosse considerada perfeita, a lei de 2009 preenchera um vazio legal e estava em processo de construção e amadurecimento, em que especialistas e organizações do setor discutiam avanços necessários no sentido da habitabilidade, da infraestrutura, dos serviços, do espaço público, da acessibilidade e da segurança da posse.
Ou seja, o que está sendo vendido como uma tentativa de desburocratização e aumento de eficiência na gestão do patrimônio público na prática esconde a possibilidade de privatização desse patrimônio e de recursos naturais. Especialistas da área como Ermínia Maricato também denunciam o que o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) classificou como “a privatização das terras, disfarçada de titulação”. A MP prevê a titulação individual da terra, por meio da transferência da propriedade, e a possibilidade da venda das terras dos assentamentos. Considerando a atual situação econômica e a capacidade de endividamento dos assentados, a pressão econômica imposta pela expansão do agronegócio e do setor imobiliário nas cidades tornará a venda inevitável.
Em nosso canal do Youtube disponibilizamos algumas das falas da audiência pública do dia 27/3: https://www.youtube.com/user/LinoPeresProfessor
Fala do Secretário Executivo do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico - IBDU, Henrique Frota: https://goo.gl/zSndTo
Fala do Secretário Executivo do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico - IBDU, Henrique Frota (parte 2): https://goo.gl/XKUfkZ
Fala de Rosane de Almeida Tierno, advogada especialista em Regularização Fundiária: https://goo.gl/UO27T7
Fala de Rosane de Almeida Tierno, advogada especialista em Regularização Fundiária (parte 2): https://goo.gl/sz4fgx
Fala do deputado federal Pedro Uczai (PT): https://goo.gl/F4prTv
Fala de Marcelo Leão, advogado da área do direito urbanística: https://goo.gl/4UGzya
Fala de Elisa Jorge da Silva, arquiteta e militante do Movimento Ponta do Coral 100% Pública: https://goo.gl/YLATYE
MANIFESTAÇÕES CONTRÁRIAS À MP 759/2016
Mais de 90 entidades assinaram a "Carta ao Brasil MP 759/2-16: A desconstrução da regularização fundiária no Brasil", que pode ser lida neste link: https://goo.gl/fNAzHG
Site que foi montado para a publicação da "Carta Ao Brasil": https://goo.gl/KVF3cJ
Debate promovido pelo Instituto de Arquitetos do Brasil - Sede São Paulo: https://goo.gl/flCpWq
Abaixo-assinado do Instituto Pólis contra a MP: https://goo.gl/fSksrk
Artigo publicado no jornal Nexo: https://goo.gl/O80kpg
Artigo sobre a inconstitucionalidade da MP 759/16: https://goo.gl/e967ss

 


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